sexta-feira, 28 de maio de 2010

Chico Xavier, maior que Jesus Cristo?

Por Rodrigo Ribeiro Rodrigues
27/05/2010 08:52h



Abaixo, uma reportagem extensa da edição de abril da Revista Super
Interessante
sobre o médium Chico Xavier. A reportagem contesta
a veracidade 'dos seus feitos', o que revoltou os seus seguidores. No Brasil,
Xavier, mesmo após a sua morte, é idolatrado por católicos, espíritas e até
mesmo quem não segue religião alguma. A idolatria é tão grande que muitos
o colocam num patamar acima de Jesus Cristo.


Confira a conflitante e revoltante matéria (para os adoradores de Chico
Xavier
) da Super Interessante:



Até hoje chegam chegam cartas a Uberaba, Minas Gerais, endereçadas
a Chico Xavier. Vêm pelo correio ou são jogadas por cima do muro do
centro em que ele trabalhava. Parece que seus autores não se lembram
de que Chico não está lá - morreu há 8 anos. Quer dizer, o homem morreu.
O mito não. Normal para quem, como ele, teve trajetória de superstar. Nos
anos 80, mais de 100 pessoas faziam fila à sua porta todo dia. Nos 90, foi
destinatário recordista de cartas no Brasil: 2 mil por mês. Seus mais de 450
livros venderam 25 milhões de cópias. E sua influência ajudou a tornar o
Brasil o maior país kardecista do mundo, com 20 milhões de fiéis. Em 2 de
abril, Chico completaria 100 anos. Nem após sua morte outro médium
despertou tamanho fascínio. O que Chico tinha de diferente? A SUPER
investigou. E achou uma fórmula com 3 ingredientes. Comecemos por
aquele que foi a origem de toda essa história: as cartas dos mortos.

As cartas


Em 35% das cartas, a assinatura era muito parecida com a do morto,
diz um estudo feito com familiares

É numa gaveta do guarda-roupa que Hilda Braga mantém há 30 anos
a carta do filho Eurípedes, morto aos 21 anos por um aneurisma. A casa
simples da periferia de Uberaba - sem telefone e cheia de eletrônicos
quebrados, como a TV preto e branco - também guardou por um tempo
100 cópias da mensagem. Mas todas já foram distribuídas por Hilda a
amigos e conhecidos. "Mãezinha Hilda, agradeço as suas preces", diz
o texto. "Encontrei na vovó Sinhana a continuação do seu devotamento
de mãe." A mensagem foi escrita pelas mãos de Chico Xavier. Mas Hilda,
hoje uma senhora de 80 anos, não tem dúvida sobre a autoria das palavras.
"Vieram de meu filho."



A declaração é comum no discurso de famílias que receberam alguma
mensagem do além por Chico Xavier. Qual o trunfo do médium capaz
de gerar essa certeza?

Pioneirismo não é. Nos anos 20, a carioca Yvonne do Amaral Pereira já
psicografava receitas do médico Bezerra de Menezes, morto no século 19.
Em Minas, Zilda Gama colocava as mãos sobre os olhos e escrevia livros
com a assinatura de espíritos. Mas os textos dificilmente continham algum
indício que servisse como prova irrefutável da autoria.

Já as psicografadas por Chico tinham indícios: dados familiares aos quais
o médium supostamente não teria acesso. Na assinada por Eurípedes, são
citados a avó Sinhana, o pai, Ibrahim, e um irmão, Vicente. Além dos amigos,
que estavam com ele nos últimos momentos de vida, e da morte pelo
aneurisma.

É um padrão nas cartas de Chico. Nomes de parentes aparecem em 93%
das mensagens analisadas em um estudo da Associação Médico-Espírita
de São Paulo, de 1990. Baseada em entrevistas com 45 famílias para quem
Chico psicografou, a pesquisa também mostrou que a assinatura da carta
era tida como muito parecida com a de seu suposto autor em 35% dos
casos.

"Foi um susto ver nas cartas o nome da babá que trabalhava em casa", diz
a mineira Célia Diniz, que recebeu uma mensagem assinada pelo filho,
morto em um acidente de bicicleta aos 3 anos de idade. Célia representa
o público cativo de Chico: as mães. Atrás de notícias dos filhos mortos,
elas compareciam em massa nos dois centros que Chico teve - o primeiro
em Pedro Leopoldo, cidade mineira onde o médium nasceu, e o segundo
em Uberaba, onde ele virou mito. Chico recebeu até mães famosas, como
a atriz Nair Bello. Ela foi 3 vezes a Uberaba antes de receber, em 1977,
uma mensagem do filho Manoel, morto dois anos antes em um acidente
de carro.

A atração das cartas estava no conforto que traziam. As mães buscavam
consolo, explicação para a perda ou um mero alívio para a saudade. E
encontravam isso nas mensagens. Além das referências familiares, que
davam o ar de autenticidade, as cartas traziam boas notícias sobre o além.
E vinham cheias de expressões reconfortantes. Grande parte começava
do mesmo jeito: "Querida mãezinha".

"Eu estava prestes a enlouquecer quando a primeira carta chegou. Já
havia pedido para ser internada", diz a paulista Sônia Muszkat. Foi em
1979 que Sônia recebeu essa mensagem do filho Roberto, morto aos 19
anos com um choque anafilático após uma cirurgia de desvio de septo.
"Na carta, Roberto descrevia sua morte e pedia que eu não me culpasse",
afirma Sônia. Ela receberia outros 53 textos psicografados por Chico.
Alguns vinham com frases em hebraico - Sônia e o marido são judeus.
Roberto não falava o idioma, mas Chico dizia ao casal que ele estava
aprendendo em uma colônia judaica no mundo espiritual. David, o pai
de Roberto, chegou a desconfiar da história. Mas acabou convencido.
"Em uma das sessões de psicografia, um cheiro delicioso de gardênias
invadiu a sala. Depois veio uma mensagem assinada por Roberto:
mãezinha querida, dedico essas flores a você."

Assim como Roberto, muitos desconfiaram das informações que apareciam
nas cartas. E desconfiam até hoje.

A rotina nas sessões de psicografia era assim: Chico se sentava à cabeceira
da mesa, todas as sextas e sábados. Psicografava 4 ou 5 cartas de parentes
de alguns sortudos entre as dezenas de presentes à sessão. Segundo Chico,
ele não podia escolher quem seria atendido - apenas os próprios espíritos.
"O telefone só toca de lá para cá", dizia. Quem entrava na fila deixava o
nome em uma lista de espera e podia até acompanhar as sessões de
psicografia, mas sem garantias. Daí a estupefação das famílias quando Chico
lia em voz alta uma mensagem cheia de referências à família e a situações
vividas pelo morto.

Mas há quem diga que Chico tinha um jeito de conseguir os
dados.
"Funcionários do centro espírita iam à fila pegar detalhes
dos mortos.
Ou aproveitavam as histórias relatadas por parentes
nas cartas em que
pediam uma audiência. As mensagens de Chico continham essas informações", diz o médico Waldo Vieira, com quem
Chico dividiu o trabalho no centro entre 1955 e 1969. A dupla psicografava
junto: quando um terminava de escrever as frases no papel, o outro assumia
o lápis. "Os dois produziam textos complementares assinados pelo mesmo
autor", diz o jornalista Marcel Souto Maior em As Vidas de Chico Xavier.
A parceria acabou nos anos 60, quando Vieira continuou seus estudos de
medicina no exterior. Hoje ele vive em Foz do Iguaçu, onde fundou um centro
de estudos religiosos.



Gente como Célia Diniz e Sônia Muszkat diz não ter fornecido qualquer
dado a Chico. Mas a pesquisa da Associação Médico-Espírita de
São Paulo
indica que Chico fazia uma entrevista - de até 10
minutos - com famílias
que participariam das sessões de
psicografia.
Aconteceu com a do engenheiro paulista Mauricio Lopes,
de 38 anos. Nos anos 70, seu irmão de 9 anos foi atropelado e morto. A
família foi várias vezes a Uberaba atrás de ajuda. "Chico perguntou a
minha mãe detalhes da morte e nomes de parentes. E tudo foi citado na
carta depois", diz Maurício.

Mas será que Chico era o líder de um grupo que saía à caça de dados de
mortos? O filho adotivo do médium, Eurípedes Higino dos Reis, garante
que não: "Chico conversava com cerca de 60 pessoas toda semana, mas
sobre vários assuntos. Elas pediam conselhos financeiros, falavam sobre
doenças. Nunca vi funcionários questionarem famílias desde que comecei
a cuidar do centro em 1975".

Até hoje poucos estudos tentaram verificar a autenticidade da psicografia
de Chico. Um dos que mais avançaram, conduzido hoje pela Federação
Espírita Brasileira, aponta que os textos podem ser genuínos. A prova
seriam fatos históricos que Chico dificilmente conheceria, mas aparecem
em alguns de seus textos

O fato é que as cartas ganharam credibilidade, inspiradas por fontes do
além ou terrenas. Até serviram como prova em 3 julgamentos - e absolveram
um empresário acusado de homicídio. (Chico psicografou uma mensagem
da vítima dizendo que a morte havia sido acidental.) As cartas geraram mais
fé do que desconfiança. A verdadeira polêmica surgiria no outro filão do
médium: os romances.

AS VOZES


Algumas das mensagens que Chico disse ouvir. E os dados que as tornam
tão impressionantes.

"Tenho procurado melhorar, a fim de auxiliar ao papai Ibrahim e aos
irmãos Vicente e os outros dois, que perfazem um trio de bênçãos para
a nossa casa."

Carta de Eurípedes Braga, psicografada em fevereiro de 1981.

"Rogo a Ricardo preparar-se com atenção para colocar o tefiliN com o
êxito necessário e habilitar-se para recitar com clareza o Sidur."

Carta de Roberto Muszkat, setembro de 1980. O texto cita as caixas de
couro e um livro usados nas rezas judaicas.

"Mamãe Elvira, você se lembrará de quantas faixas precisei para suportar
as queimaduras."

Carta de Ericson Fábio Diniz de Oliveira, abril de 1985. Ericson morreu
por causa de queimaduras sofridas em um acidente com tíner.

"Sou eu, o Tetéo.Vovô me auxilia a escrever, porque estou aprendendo."

Carta de Rangel Diniz Rodrigues, novembro de 1984. Rangel morreu
antes de ser alfabetizado, aos 3 anos de idade.

"O carro deslizou sem que eu pudesse controlá-lo. A manobra infeliz
veio fatal e com tamanha violência que a idEia de suicídio não devia vir
à baila."

Carta de Manoel Francisco Neto, psicografada em junho de 1977.
Manoel era filho da atriz Nair Bello e morreu em um acidente de
carro.



A polêmica


Show de materialização de espíritos e truques para incrementar as
sessões de psicografia. O lado pirotécnico de Chico Xavier provocou
desconfiança. E atraiu de vez a atenção da mídia.

A carreira literária de Chico começou cedo. Aos 22 anos, ele publicava
Parnaso de Além-Túmulo, um livro com poesias psicografadas de nada
menos do que 14 poetas célebres, do Brasil e de Portugal. Uma estreia
inspirada por um conselho vindo da mãe de Chico. Da finada mãe de
Chico.

Chico tinha acabado de entrar em contato com o espiritismo.
Aos 17 anos, Francisco Cândido Xavier - seu nome completo,
pelo qual ainda era conhecido - acompanhou uma irmã doente
a um tratamento espírita em Pedro Leopoldo (cidade em que
morava com os pais e os 15 irmãos). Lá, conheceu a obra de
Allan Kardec. E foi incentivado por líderes espíritas a psicografar.
Logo nas primeiras cartas psicografadas, veio a carta de sua mãe,
morta quando o médium tinha apenas 5 anos de idade. Ela pedia
que Chico se aprofundasse no espiritismo.

Chico seguiu o conselho. Em grande estilo. Ele dizia que não
escolhia os espíritos a quem atenderia, só via fantasmas e ouvia
vozes. Mas parecia ser o escolhido pelas celebridades do céu. Cruz
e Sousa, Olavo Bilac, Augusto dos Anjos e Castro Alves lhe ditaram
versos e prosa. O material viraria o Parnaso.

No mundo de poesias espíritas, ninguém havia publicado um livro
invocando tantos nomes importantes do além. O lançamento colocou
Chico Xavier sob os holofotes. Não só porque ele dizia que gente da
Academia Brasileira de Letras estava agora escrevendo por uma via
pouco ortodoxa. Mas porque o rapaz de 22 anos tinha produzido obras
razoavelmente fiéis ao estilo dos autores que as assinavam. E sem ter
tido uma educação formal. Chico havia estudado até a 4ª série do
primário. Deixou o colégio aos 13 anos, porque havia começado a
trabalhar - primeiro em uma fábrica de tecidos, depois como caixa
de um armazém.

A história dividiu o mundo da literatura. Alguns desconfiavam de
que tudo não passava de uma fraude. A viúva de Humberto de
Campos até tentou na Justiça, sem sucesso, levar os direitos
autorais sobre as obras psicografadas do marido. Mas outros o
defendiam. "Se Chico Xavier

A desconfiança dos críticos tinha motivo. Apesar de não ter ido longe
na escola, Chico foi autodidata e leitor voraz durante toda a vida.
Colecionou cadernos com recortes de textos e poesias. Comprou livros
de sebos em São Paulo. Em sua biblioteca, preservada até hoje em
Uberaba, há mais de 500 livros e revistas, com obras em inglês, francês
e até hebraico. A lista inclui volumes de autores cujo espírito o teria
procurado para escrever suas obras póstumas, como Castro Alves e
Humberto de Campos.

O debate em torno dos romances colocou Chico na mídia. "Foi aí que
ele ficou conhecido", diz Nestor João Masotti, presidente da Federação
Espírita Brasileira. Pesquisadores começaram a bater à porta do médium.
Em 1939, até cientistas russos tentaram estudar seus poderes. "Mas Chico
recusou, dizendo que seu guia espiritual Emmanuel não autorizava", diz
Souto Maior em seu livro.

Das investidas da imprensa ele não escaparia. Eles queriam explicações
não só para a linha direta que Chico dizia ter com as celebridades do outro
lado, mas também para alguns shows que o médium andava fazendo por
aí.

produziu tudo aquilo por conta própria, merece quantas cadeiras quiser na
Academia Brasileira de Letras", declarou Monteiro Lobato.



A pirotecnia


O que você veria se estivesse na plateia de Chico Xavier na década
de 1940? Pra começar, um médium sentado em frente a uma cortina,
a cerca de 10 metros dos espectadores. Luzes coloridas surgiriam detrás
do pano. Um cheiro de éter encheria a sala. Lentamente, vultos brancos
apareceriam - os médiuns explicavam que eram espíritos que haviam
se materializado. "Muitas vezes a plateia podia até tocá-los e tirar fotos",
afirma o médico espírita Eurípedes Tahan, que por mais de 30 anos
acompanhou Chico em Uberaba e participou de várias dessas reuniões.
Em alguns casos, o médium expelia uma pasta branca da boca, do nariz
e dos ouvidos. Seria o ectoplasma, um produto da energia dos espíritos,
considerado prova material da existência do além.

Os personagens principais da noite eram médiuns de outras cidades,
acostumados a rodar o país com seus shows. Mas, em algumas delas,
o próprio Chico emprestava seus poderes para a materialização. Ficava
sentado em concentração enquanto os espíritos surgiam por detrás do
pano. Registre-se: materializar uma pessoa, ou fazer surgir massa do
nada equivalente a um homem de 70 quilos, não seria tarefa fácil. Seria
necessário produzir um total de energia duas vezes maior do que é hoje
produzido pela hidrelétrica de Itaipu por ano, segundo os cálculos feitos
por especialistas e exibidos por reportagens sobre Chico nos anos 70.

Com shows como esses, Chico foi ficando famoso, graças a reportagens
como uma publicada em 1944 por O Cruzeiro, então a revista mais
importante do país. Mas ele ganharia manchetes mais bombásticas uma
década depois. No fim dos anos 50, Amauri Pena Xavier, sobrinho do
médium que também psicografa, deu uma entrevista ao jornal Diário de
Minas - dizendo-se uma farsa. "Aquilo que tenho escrito foi criado pela
minha própria imaginação", declarou. Só que o rapaz, de 25 anos à época,
também insinuou que as cartas produzidas por Chico Xavier poderiam
ser uma fraude. "Assim como tio Chico, tenho enorme facilidade para fazer
versos, imitando qualquer estilo de grandes autores. Com ou sem auxílio
do outro mundo, ele vai continuar escrevendo seus versos e seus livros."

Pegou mal para o tio. Mesmo depois que o sobrinho, denunciado como
alcoólatra pelo próprio pai, pediu desculpas publicamente pelo que disse.
Chico respondeu: "Não recebi as palavras dele como acusação nem desafio.
Tenho a felicidade de possuir amigos que, em matéria religiosa, não
possuem a mesma convicção que eu". Acuado pelas críticas na Pedro
Leopoldo de 15 mil habitantes, Chico resolveu fazer as malas e partir
para Uberaba, um polo do espiritismo onde contaria com o apoio de
amigos. Mas não adiantou muito.

A imprensa seguiu na cola. Em 1971, um repórter da revista Realidade,
José Hamilton Ribeiro, visitou as sessões de psicografia. E denunciou:
tinha truque ali. "Meu fotógrafo viu um dos assessores de Chico
levantar
o paletó discretamente e borrifar perfume no ar. As
pessoas pensavam que
o perfume vinha dos espíritos", diz Ribeiro.
Os questionamentos colocavam Chico cada vez mais em evidência no
país. E o prepararam para aquela que seria sua prova final na mídia,
também em 1971: o programa Pinga-Fogo, da TV Tupi.

Por quase 3 horas, o médium foi bombardeado por perguntas.
Mas se safou. "Não me constam que obras complexas como a
de Platão e Aristóteles tenham sido psicografadas. Não seria por
causa da dificuldade?", questionou João de Scantimburgo, respeitado
escritor da Academia Brasileira de Letras e homem católico. Chico
respondeu: "Com todo respeito ao senhor, eu me permitiria
perguntar se eles também não seriam médiuns". Assim Chico
driblou os ataques. Disse estar sendo ajudado pelo guia Emmanuel.
Foi um recorde de audiência: 75% dos televisores paulistas ficaram
ligados no programa até as 3 horas da manhã. A entrevista rendeu
retransmissão para 4 emissoras em rede nacional. Estava pronto o
mito Chico Xavier.

A POLÊMICA HOJE


Ainda tem gente tentando entender os fenômenos de Chico,
vasculhando as referências históricas e literárias que ele deixou
em seus livros.



Literárias


Chico poderia ter plagiado obras. É o que investiga o espírita Vitor
Moura, criador do site Obras Psicografadas. A tese é baseada na
comparação entre textos. Como esta:

• "Ao norte, os barrancos cobertos de neve do Hermon se recortam
em linhas brancas no céu; a oeste, os planaltos ondulados da
Gaulonítida e da Pereia." Vida de Jesus, do filósofo Ernest Renan.

• "Ao norte, as eminências nevosas do Hermon figuravam-se em
linhas alegres e brancas, divisando-se ao ocidente as alevantadas
planícies da Gaulanítida e da Pereia." Há Dois Mil Anos, de Chico
Xavier
.

Históricas


A Federação Espírita Brasileira está avaliando citações históricas
que aparecem nos romances de Chico. Pelo que já foi apurado, os
pesquisadores defendem que as cartas podem mesmo ter vindo do
além. "Alguns relatos são tão detalhados que Chico não os faria nem
com a ajuda das melhores bibliotecas", afirma Gilberto Trivelato,
coordenador do estudo. "Um deles diz que a Catedral de Notre-Dame,
em Paris, tinha escadas. Hoje ela não tem. Mas, se você pesquisar a
fundo, descobre que no século 19 tinha, por causa de enchentes."

A CIÊNCIA E CHICO XAVIER


Palavras do outro mundo? Fraude? Nem um nem outro. Para cientistas,
a explicação pode estar num meio-termo.

Psicose


Nada de espíritos - por essa tese, as cartas seriam produzidas pelo
próprio Chico. Só que ele não se lembraria disso. É como se fosse
uma ação do inconsciente, ou de uma outra personalidade que ele
assumiria. "A mente deixaria de ser única e vários pedaços assumiriam
vida autônoma", afirma o psiquiatra Alexander Moreira de Almeida.
"Mas fizemos testes com 115 médiuns, e eles têm uma sanidade
mental acima da média da população", diz.

Epilepsia


Nos anos 70, a revista Realidade publicou a cópia de um
eletroencefalograma do cérebro de Chico Xavier. Sem saber
o nome do paciente, um médico analisou o exame e concluiu:
havia ali uma descarga elétrica anormal, capaz de provocar uma
convulsão. "Poderia causar alheamento, sensação de ausência,
automatismo psicomotor", afirmava o médico Juvenal Guedes.

Criptomnésia


Um distúrbio de memória que faz com que as pessoas se esqueçam
de que conhecem uma determinada informação. Os dados que Chico
colocava nas cartas seriam apenas lembranças escondidas em seu
próprio subconsciente. "Mas não há exame que detecte memórias
falsas. Para evocá-las, o cérebro usa exatamente o mesmo mecanismo
das verdadeiras", explica o neurologista Ivan Izquierdo, especialista
em memória da PUC do Rio Grande do Sul.

Telepatia


Tem cientista que acredita que Chico poderia captar, inconscientemente,
as memórias do morto - só de conversar com um parente dele. "O médium
poderia usar poderes considerados paranormais para captar informações
direto da cabeça das pessoas", afirma o psiquiatra Almeida. Até hoje, no
entanto, a telepatia ainda não foi provada pela ciência.

O carisma


Órfão Maltratado na infância, um piadista quando adulto, vítima
de UMA SÉRIE DE doenças na velhice. Não foi à toa que Chico
Xavier
conquistou a compaixão de todo o país.

"Em 1931, o espírito do poeta Augusto dos Anjos sentia muita
dificuldade em escrever por meu intermédio. Na época eu
trabalhava em um armazém e cuidava de uma plantação de alho.
Os espíritos começavam a conversar comigo. E então ele ditou
uma poesia, chamada Vozes de uma Sombra. Começou a falar
com aquelas palavras maravilhosas, muito técnicas. Eu com o
regador na mão e custava a compreender. Quem era eu pra
entender aquilo, que estava aguando canteiro de alho?", contava
com jeitinho mineiro, fazendo a plateia do Pinga-Fogo gargalhar.
Chico era um piadista. Mas não só o humor deu o carisma que o
acompanharia até o fim da vida. Chico Xavier era visto como um
mártir, acima de tudo.

A começar por sua história antes de virar o médium que o país
conheceu. Mineiro de família pobre, Chico dizia ouvir espíritos
aos 5 anos de idade. Afirmava conversar com a mãe, recém-falecida.
Da madrinha, com quem morava, ouviu um diagnóstico: estaria
louco. E ganhou uns corretivos: garfadas (isso, golpes com garfo
mesmo) no abdome. Rita de Cassia, a madrinha, ainda o obrigava
a lamber as feridas de um primo, pra não falar mais daquelas
maluquices de além. Órfão, mal-tratado e obrigado a trocar a
escola pelo trabalho: assim era o pequeno Chico Xavier. Pelo
menos na visão que Clementino de Alencar, jornalista de O Globo,
passou em uma das primeiras reportagens sobre o médium, de 1935.
Ela serviria como base para muitas das biografias já lançadas sobre
Chico, e ajudaria a perpetuar a imagem de sofredor atribuída ao
médium. Mesmo que detalhes da história tenham sido mais tarde
desmentidos, como a versão de que Chico não era letrado.



Contribuiu para essa imagem uma política adotada por Chico desde
sua primeira obra: doar todo o dinheiro conseguido com os direitos
autorais de seus livros às editoras espíritas que os publicavam - e
que costumavam manter instituições assistenciais. Ele nem assinava
as obras. A autoria ficava em nome do espírito que teria ditado as
palavras, como André Luiz e Emmanuel, os mais frequentes. "Os
livros não me pertencem. Não escrevi nada. Eles escreveram", dizia.
Se tivesse ficado com os direitos autorais, Chico teria levado uma
bolada: 2,1 milhões de cruzeiros por ano, o suficiente para comprar
160 fuscas na época e equivalente a R$ 670 mil hoje. O cálculo foi
feito nos anos 70 por especialistas, considerando uma venda de 300
mil livros por ano. Com a doação, Chico ajudou mais de 2 mil
instituições do país, segundo seus assessores.

Desde 1960, quando se aposentou, Chico vivia com uma pensão de
funcionário público (trabalhou como escrivão e datilógrafo no
Ministério da Agricultura). Sua casa em Uberaba, preservada pelo
filho Eurípedes, tinha um portão de quase 3 metros de altura para
impedir que os mais fanáticos a invadissem. Por dentro era simples:
tinha móveis baratos de madeira corroídos e decoração feita com
presentes dos amigos (bordados, mantas, placas, quadros). Está lá
também a coleção com mais de 40 boinas, que Chico usava para
esconder a careca (e que substituiriam as perucas).

O médium também aparecia sob os olhos do país como um homem
de saúde frágil. Ainda em seus 20 anos, quando já passava horas em
sessões de psicografia à luz de velas, Chico descobriu uma catarata no
olho direito. Depois dos 60, sofreu com pressão alta, uma hérnia e um
tumor na próstata, que ele se recusou a operar com Zé Arigó, o amigo
médium que dizia receber o médico Dr. Fritz. Em junho de 2001, quando
se acreditava que estaria à beira da morte por causa de uma pneumonia
nos dois pulmões, Chico conseguiu se salvar. E o Brasil inteiro comentou
o que parecia um milagre.

Uma imagem captada pela TV Globo mostrou um raio de sol entrando
no quarto do medium exatamente no dia em que Chico teve uma melhora
repentina. "Ele já vinha tomando antibióticos havia 4 dias quando, de
repente, começou a se recuperar", diz Eurípedes Tahan, o médico então
responsável por Chico, e também amigo do médium. Dois dias depois,
Chico recebia alta do hospital. Providência divina ou resultado dos
remédios? Ninguém cravou a resposta. Mas o vídeo do episódio
continua sendo visto até hoje pelos brasileiros no YouTube - tem mais
de 100 mil visualizações.

Chico morreu em 2002, aos 92 anos, cumprindo uma profecia sua.
"Só vou morrer no dia em que o Brasil todo estiver feliz", dizia Chico.
E morreu mesmo. O médium teve uma parada cardíaca no dia 30 de
junho, horas antes de o Brasil ganhar a Copa do Mundo de Futebol.
Cerca de 120 mil pessoas foram a seu enterro, formando uma fila de
4 quilômetros e 3 horas de espera. O então presidente Fernando
Henrique Cardoso emitiu uma nota lamentando a ida daquele que
era "um grande líder espiritual e uma figura querida e admirada pelo
Brasil inteiro".



Assim que Chico morreu, vários documentos que ele guardava
- em geral cartas de pessoas que escreviam para ele - foram
queimados por seu filho adotivo, Eurípedes Higino. Foi um
pedido do pai em testamento. "Ele achava que era necessário
para não dar nenhuma confusão para ninguém no futuro", diz.
O filho também cuida da marca que se criou em torno de Chico
Xavier
Chico Xavier, nos cinemas brasileiros a partir de abril).
O trabalho de Chico continua hoje nas mãos de outros médiuns,
como seu colega e seguidor Carlos Bacelli, que atrai centenas de
fiéis por semana a suas sessões de psicografia em Uberaba (há
excursões toda semana saindo de São Paulo e do Rio de Janeiro).
Bacelli inclusive diz receber mensagens do próprio Chico Xavier.
E não é o único. "Mais de 20 médiuns já disseram ter psicografado
textos de Chico", diz Higino. "Tudo mentira. Chico disse que não
voltaria tão cedo." Como ele tem tanta certeza? O pai teria deixado
um código, conhecido apenas por Higino e por Tahan, para ser
identificado caso resolvesse mandar um alô para o mundo dos
vivos. "Continuaremos esperando", diz o filho.



Com informações
de Revista Super Interessante/ OGalileO

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